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terça-feira, 29 de novembro de 2011

PARA ENRIQUECIMENTO: INCLUSÃO - tecer pontos, desatar nós

Jane Haddad: inclusão - tecer pontos, desatar nós

Atenção, abrir em uma nova janela. 
http://www.direcionalescolas.com.br/images/stories/redacao/img49.pngDirecional Escolas – O que você tem observado como experiência de inclusão na educação básica, tanto em escolas públicas quanto privadas?
Jane Haddad – Entendo Inclusão social como um processo a ser construído diariamente, incluir não é uma ação natural em uma sociedade que prima por modelos ideais de beleza, inteligência e desempenho. Aceitar o "diferente” é uma construção lenta, já que a mesma envolve expectativas e desejos frustrados.
Ao acompanhar o processo de inclusão em diversas escolas, pude perceber uma característica interessante, nas séries iniciais: as crianças menores apresentam maior aceitabilidade em receber o coleguinha “diferente” e inclusive esforçam-se naturalmente para integrá-lo ao grupo. Em contrapartida, os adultos (professores e pais) apresentam mais resistência em lidar com crianças e jovens que fogem aos padrões estabelecidos do aluno-filho “normal”. Verifico na prática docente certa dificuldade de acolher até o colega-professor que apresenta ideias contrárias
A educação inclusiva permite um repensar e uma possibilidade de lançar o olhar para diversas direções.
Direcional Escolas – A lei é realista ao determinar que todos os estudantes tenham acesso à mesma experiência de aprendizagem em um grupo pautado pela diversidade? Há situações em que o convívio dessa heterogeneidade seja impossível em um ambiente de aprendizagem?
Jane Haddad – De acordo com Fávero (FÁVERO; PANTOJA & MANTOAN, 2004 – p. 11), a “educação inclusiva garante o cumprimento do direito constitucional indisponível de qualquer criança de acesso ao ensino fundamental, já que pressupõe uma organização pedagógica das escolas e práticas de ensino que atendam às diferenças entre os alunos, sem discriminações indevidas, beneficiando a todos com o convívio e crescimento na diversidade”.
Pergunto-me como cumprir tal lei, contemplando uma educação que atenda às diferenças de cada um, se trabalhamos com um currículo ainda classificatório e excludente? Uma educação pautada na diversidade deverá indagar o sentido do currículo escolar. Começaria pensando um currículo que contemple os sentidos, o lúdico, a sensibilidade, o estético, alicerçado na forma de olhar e reconhecer a importância da diversidade e que favoreça um debate entre todos os envolvidos na comunidade educativa.
Não acredito em uma educação inclusiva imposta como uma obrigatoriedade, colocar todos os alunos para dentro das escolas não garante uma inclusão, o que muitas vezes acompanhamos é uma segregação dentro de uma pseudo-inclusão. Vivemos uma escola que ainda estimula a competição pela competição, o que já é excludente. Defendo a inclusão que começa em cada um de nós, primeiro nos aceitando em nossas limitações, para que possamos aceitar o outro. Uma proposta inclusiva deve contemplar uma concepção de sujeito, de educação e de mundo. Que pessoa queremos ajudar a formar? Para atuar de que forma no mundo? Pautado em quais princípios e valores?
Na década de 80 acompanhamos o surgimento da proposta de integração educativa. O ensino dos alunos portadores de necessidades educativas especiais poderia ser realizado no contexto da escola regular. Cardoso (2003, p.19-20) aponta que “[...] a ênfase consiste em oferecer ao aluno uma mediação. A finalidade primordial é analisar o potencial de aprendizagem, como sujeito integrado em um sistema de ensino regular, avaliando ao mesmo tempo quais os recursos que necessita para que sua evolução seja satisfatória”.
Direcional Escolas – Em sua opinião, qual é o conceito de “inclusão” previsto pela legislação e qual deveria ser o acolhido?
Jane Haddad – Do meu ponto de vista, estamos engatinhando rumo a uma projeto educativo inclusivo. Nossas escolas estão sustentadas em tradições homogêneas, nossos professores ainda fundamentam suas teorias e práticas em modelos fechados, em que só entram alunos bons e produtivos. Trabalhar a diversidade e a diferença é um longo caminho a ser percorrido.
A legislação determina que todos os alunos devem estar incluídos, matriculados e assíduos nas escolas. Devem ser estimulados em seu processo cognitivo, incluídos em suas limitações e principalmente desenvolver- se e vir a ser um cidadão! Vir a ser? Então ele ainda não é? A legislação é um tanto ingênua e oferece uma longa distância entre o ideal e o real de uma prática pedagógica inclusiva, já que nossa estrutura curricular, métodos e técnicas de ensino, bem como a questão da avaliação, são extremamente excludentes. Como avaliar uma criança ou jovem com limitações cognitivas? Levando em conta nosso processo de avaliação?
Direcional Escolas – Em sua experiência, quais os comportamentos e posturas você identificou entre os pais em relação a isso? Eles próprios têm dificuldades e/ou expectativas que dificultariam a “inclusão” de seus filhos?
Jane Haddad - Quando comentei em minha conferência no Saber (em setembro de 2011, em São Paulo) sobre rever o processo de inclusão nas escolas, defendi repensar o currículo como ponto de partida, levando em conta que crianças e jovens “diferentes" apreendem de formas diferentes, usam habilidades que nem sempre nós educadores conhecemos. Só haverá inclusão e aprendizagem se houver desejo e mobilização por parte do professor e aluno. O professor necessita acreditar e desejar incluir seus alunos “diferentes”, para isso ele precisa ser preparado e instrumentalizado. Mas nem sempre isso acontece, até mesmo por conta do despreparo do professor, ou do currículo e projeto pedagógico ineficientes para tal proposta.
Aprender é o ponto fundante na vida de qualquer ser humano, incluir é revisitar esse ponto, lembrando que aprender requer sempre uma relação humana; professor aluno, pais filhos, mediados por um sentimento de desejo e cuidado Não há limitação quando há desejo e determinação por parte dos educadores e pais. Incluir ultrapassa diagnósticos conclusivos, laudos determinantes ou intervenções apenas psicofarmacológicas.
Direcional Escolas – Um recado final?
Jane Haddad – Deixo algumas pistas para uma mudança efetiva:
O cuidado, o acolhimento das diferenças, o amor e competência técnica permitem abrir novos canais de aprendizagem que contemplem uma ação inclusiva, uma aprendizagem real, que ultrapassem as limitações.
O currículo educacional ainda é fechado em si mesmo, um instrumento que não anuncia a que veio, apenas direciona e contempla o bom aluno, classifica e solicita um aluno que reproduz e devolve resultados quantitativos. Quem sabe assim, um dia ele será alguém e conseguirá uma boa posição no mercado de trabalho. No fundo, não é isso que esperamos?  Penso que estamos muito preocupados em definir diversidade/homogeneidade, certo/ errado, bom/ mal, baseado em pensamentos "vazios de sentido", sentido esse que vejo nitidamente como ausente. Muitos de nós educadores não reconhecemos um verdadeiro sentido em ensinar tais conteúdos, e mesmo assim continuamos fazendo. Pensar e falar sobre inclusão é resgatar o sentido da educação, levar em conta a maravilha que é a diversidade e suas possibilidades. Porque precisamos de leis para que os alunos "diferentes" possam ter seus direitos garantidos?
O que nossa experiência pode nos ensinar...
Em primeiro lugar, aprender com ela e procurar não cometer os mesmos erros. Passei minha vida de estudante ouvindo que eu era diferente, agitada, muito inteligente, mas não aprendia porque não tinha atenção. Meu nome na época era DCM (disfunção cerebral mínima), hoje conhecido como TDAH (Transtorno do Déficit e atenção/ hiperatividade ). Passados anos na escola, primeiro como aluna e depois como professora e coordenadora, reconheço ainda hoje o mesmo discurso com novas roupagens: alunos diferentes, fora do ritmo da turma, com um relógio biológico funcionando contrário ao relógio da escola e do tempo da urgência em que estamos mergulhados.
O próximo ponto
Instigar novas perguntas, estimular pesquisas empíricas sobre o tema, escutar os professores em suas dificuldades reais . Tecer inclusão requer criatividade, curiosidade e diferentes formas de lidar com o saber , teremos que rever o binômio adaptação- reprodução. "Cada um de nós é um mesmo diferente": isso significa que é nas diferenças que nos tornamos semelhantes.
Tecendo Inconclusões
Tecer inconclusões nos permite estar em aberto, construir e reconstruir nossa relação com o saber, rever concepções e ações, incluir o conceito inclusão para além de discursos “vazios”. Tecer ponto a ponto. A sociedade é o grande tear, a escola um ponto, a família seu contraponto... Nossos alunos são pontos a serem tecidos, um ir e vir,  vão e vêm, mostrando pontos a serem dados e nós a desatar, tecer uma educação de boa qualidade para todos, que ofereça oportunidades será o grande nó a ser desatado na legislação de uma educação inclusiva que ultrapasse as barreiras da exclusão!
Referências
CARDOSO, M. Aspectos históricos da educação especial: da exclusão à inclusão: uma longa caminhada. In: MOSQUERA, J. M.; STOBAÜS, C. (Org.).Educação especial: em direção à educação inclusiva. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.
MANTOAN, M. T. E. Educação para todos: desafios, ações, perspectivas da Inclusão nas escolas brasileiras. Universidade Estadual de Campinas - ISSN:1517-3992. 2002. Revista On-line da Biblioteca Prof. Joel Martins.
Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 23 dez. 1996

Jane Patrícia Haddad Pedagoga, com especialização em Psicopedagogia, Docência do Ensino Superior e Psicanálise. Atuou por mais de 20 anos em escolas como professora, coordenadora pedagógica e diretora, é consultora institucional e conferencista.
Mais informações:   janepati@terra.com.br  

4 comentários:

  1. para que a inclusão aconteça de verdade, é preciso que mudemos nossa postura,na questão de aceitar o outro do jeito que ele é,pois sabemos que a inclusão não significa so aceitar o outro em determinados espaços, é preciso que favorecemos a ele, meios para que realmente se sinta incluído dentro do grupo e que também, seja tratado de igual para igual.
    EUNICE AMARO

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  2. para que a inclusão aconteça de verdade, é preciso que mudemos nossa postura,na questão de aceitar o outro do jeito que ele é,pois sabemos que a inclusão não significa so aceitar o outro em determinados espaços, é preciso que favorecemos a ele, meios para que realmente se sinta incluído dentro do grupo e que também, seja tratado de igual para igual.
    EUNICE AMARO

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  3. A inclusão rompe com os paradigmas que sustentam o conservadorismo das escolas,
    contestando os sistemas educacionais em seus fundamentos. Ela questiona a fixação de
    modelos ideais, a normalização de perfis específicos de alunos e a seleção dos eleitos
    para frequentar as escolas, produzindo, com isso, identidades e diferenças, inserção
    e/ou exclusão.
    A educação inclusiva concebe a escola como um espaço de todos, no qual os alunos constroem o conhecimento segundo suas capacidades, expressam suas idéias livremente, participam ativamente das tarefas de ensino e se desenvolvem como cidadãos, nas suas diferenças.
    Nas escolas inclusivas, ninguém se conforma a padrões que identificam os alunos como
    especiais e normais comuns. Todos se igualam pelas suas diferenças!
    Para atender a todos e atender melhor, a escola atual tem de mudar, e a tarefa de mudar
    a escola exige trabalho em muitas frentes. Cada escola, ao abraçar esse trabalho, terá
    de encontrar soluções próprias para os seus problemas. As mudanças necessárias não
    acontecem por acaso e nem por Decreto, mas fazem parte da vontade política do coletivo
    da escola, explicitadas no seu Projeto Político Pedagógico - PPP e vividas a partir de uma
    gestão escolar democrática.
    Carminda Leão

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  4. A escola para a maioria das crianças brasileiras é o único espaço de acesso aos conhecimentos universais e sistematizados, ou seja, é o lugar que vai lhes proporcionar condições de se desenvolver e de se tornar um cidadão , alguém com identidade social e cultural

    Melhorar as condições da escola é formar gerações mais preparadas para viver a vida na sua plenitude, livremente, sem preconceitos, sem barreiras. Não podemos nos contradizer nem mesmo contemporizar soluções, mesmo que o preço que tenhamos de pagar seja bem alto, pois nunca será tão alto quanto o resgate de uma vida escolar marginalizada, uma evasão, uma criança estigmatizada, sem motivos.

    A escola prepara o futuro e de certo que se as crianças conviverem e aprenderem a valorizar a diversidade nas suas salas de aula, serão adultos bem diferentes de nós, que temos de nos empenhar tanto para defender o indefensável.

    A inclusão escolar remete a escola a questões de estrutura e de funcionamento que subvertem seus paradigmas e que implicam em um redimensionamento de seu papel, para um mundo que evolui a "bytes".

    O movimento inclusivo, nas escolas, por mais que seja ainda muito contestado, pelo caráter ameaçador de toda e qualquer mudança, especialmente no meio educacional, é irreversível e convence a todos pela sua lógica, pela ética de seu posicionamento social.

    A inclusão está denunciando o abismo existente entre o velho e o novo na instituição escolar brasileira. A inclusão é reveladora dessa distância que precisa ser preenchida com as ações que relacionamos anteriormente.

    Assim sendo, o futuro da escola inclusiva está, ao nosso ver, dependendo de uma expansão rápida dos projetos verdadeiramente embuídos do compromisso de transformar a escola, para se adequar aos novos tempos.

    Se hoje ainda são experiências locais, as que estão demonstrando a viabilidade da inclusão, em escolas e redes de ensino brasileiras, estas experiências têm a força do óbvio e a clareza da simplicidade e só essas virtudes são suficientes para se antever o crescimento desse novo paradigma no sistema educacional.

    Não se muda a escola com um passe de mágica.

    A implementação da escola de qualidade, que é igualitária, justa e acolhedora para todos, é um sonho possível.

    A aparente fragilidade das pequenas iniciativas, ou seja, essas experiências locais que têm sido suficientes para enfrentar o poder da máquina educacional, velha e enferrujada, com segurança e tranquilidade. Essas iniciativas têm mostrado a viabilidade da inclusão escolar nas escolas brasileiras.

    As perspectivas do ensino inclusivo são, pois, animadoras e alentadoras para a nossa educação. A escola é do povo, de todas as crianças, de suas famílias, das comunidade, em que se inserem.

    Crianças, bem-vindas à uma nova escola !
    Abraços, Carla Lédo.

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